Nada é novo no ano novo. A meia-noite é a mesma, os fogos de artifício contêm o mesmo vermelho-lítio artificial e sonolento. O champanhe continua amargo, amarelado como os sorrisos dos presentes. Rituais falhos e dotados de nada.
Festa? Tenho medo do amanhecer novo. Do mundo novo do ano que, nos planos, era novo. Cheio de coisas recicladas – e recicláveis. As datas são as mesmas, os aniversários são os mesmos, tem sempre alguém que morre, alguém que casa. Ano velho que rege as mesmas pessoas velhas. Temo a falsa esperança (e, ao mesmo tempo, a falta de esperança) que banha os mesmos dias novos do ano passado. Que é o ano novo senão o ano velho mais um?
Não. Não deve.
O ano novo não deve ser novo por trazer um número novo, novas numerologias, novos horóscopos. O ano deve ser novo por nos trazer tempo, mais tempo (tempo novo?), esse sim o nosso maior tesouro.
Ano novo deveria se chamar mudança. Ele não deveria esperar até a noite de 31 de dezembro para acontecer. Dorme em cada um de nós. Pode acordar dia 30 de maio, 14 de agosto. Pode demorar dez, cem anos para acordar. Pode acordar a cada cinco dias, pode morrer dormindo.
Não façamos do ano novo um olhar da lenta marcha verde do mudar das estações. Que ele seja branco, não só da paz e sim das coisas que esperam ser feitas – e por que não escritas? E nos preparemos para o fatídico dia onde 365 dias passam em 24h. Haja champanhe para sermos capazes de agüentar!
Assim, não vos desejo um feliz ano novo, mas um novo ano novo.
- Não tem jeito de dizer "hoje eu não escrevo". Saiu e, se dá vontade de postar, se posta. Visivelmente inspirado no poema de ano novo de Drummond que eu esqueci o nome, lição não de ano novo, mas de vida. Façam da vida de vocês mudança. E vivam (viva) o ano novo.