sábado, 30 de abril de 2011

Confissão - como se eu fosse deus

            Eu já não sou o que me forma ou tão somente isso. Eu desaprendi a função do meu nome. Busco-me no que me foi tomado e no que ainda não me foi dado. Já não me acho no presente ou talvez nunca tenha me achado. O presente não existe, por isso me sinto no futuro. Projeto-me para o seguinte, o que eu sei que é, foi.
            Não posso dizer que andei muito por aí, mas estive em vários lugares, com várias pessoas, dentro delas – apesar de que poucas estiveram profundamente em mim para, de fato, estarem em algum minuto do meu tempo. Vi muitas coisas, me maravilhei de algumas, todas as vezes sem muita cor nos olhos – me horrorizei de outras e em todos os estágios do horror, sempre diminuído diante da miséria alheia ou da minha própria.
            Hoje eu não sei o que faço. Será que fico ou que passo? Nada me salta aos olhos ou inquieta  minha respiração. Tudo parece chato ou fácil ou ainda previsivelmente triste. Como se eu fosse deus e vocês os humanos e eu visse que no futuro de cada um há somente o pranto, mas que, independentemente de qualquer coisa, eu passarei inalterável. É uma segurança tão grande que se faz falsa no mais primeiro segundo de conforto. Só o que eu escuto são repetições e depois um grande eco reto. Já vi tudo isso e sei que, lentamente, passo para o outro lado, mesmo que de forma involuntária, com um contra-sorriso nos lábios.
            Me desculpe por você ter visto ou ouvido aquilo – aquele eco, aquela mancha. Mas hoje eu consigo finalmente dizer não para você. Dizer nada.
            Em queda livre. Completo. Eu só tenho uma falha: eu não sei para onde caio.

- Antigo. Postei na saudade. Passando pela maior brainstorm da minha vida.

sábado, 9 de abril de 2011

O escuro pessoal generalizado


            Não há linha na escuridão. Não há ponto na escuridão. Não há formas ou meios na escuridão. Mas há, sim, todas as linhas, pontos, formas e meios de se fazer escuro.
            A gente tem medo do que é bom porque teme que um dia acabe. A gente ainda não se acostumou no eterno porque teme o que é maior que a gente. O eterno é grande demais para as nossas cabeças e pequeno demais para as nossas vontades. O eterno não cabe nas nossas vidas e nas nossas vistas, por mais que elas mirem o horizonte e não o horizontal.
            A gente precisa ser feito de algo e tem que ser bom. A gente não suporta ser feito de nada, ao menos um segundo passar e não mudar nada. A gente quer fazer a diferença, mesmo que para pior. A gente precisa ver que o mundo é feito, ao menos um pouco, de cada um, mas a gente esquece que não somos feitos da gente o tempo todo.
A gente tem um pouco dos animais que cultivamos e sentimos medo. A gente tem um pouco do que tem nas mãos, quase sempre sujas, mas nunca vazias. A gente tem um pouco dos outros e de nossas memórias com eles e, quanto mais forte a gente queria que essas memórias fossem reais, maior é esse pedaço. A gente tem a fé de que vai mudar um dia, só não sabe pra onde e nem a partir de onde, pois a gente não sabe que gente muda na gente.
A gente tem uma linha, mas não tem um ponto. A gente quer ter um meio sem ter uma forma. A gente está completamente perdido na escuridão. E é só isso que a gente tem: o escuro, para dele criar claridades de onde tirar linhas, pontos, formas e meios de ficar, de alguma forma, fora dele, debaixo de alguma luz.
Só que a gente não sabe de uma coisa: não há o lado de fora do escuro. O escuro é tudo o que a vista não alcança e a vista não é eterna. Quem pisa na borda do escuro sente dor, mas quem vive dentro do escuro é feliz. O escuro que a vista não vê e que não cabe na vida da gente.

- Queria ter postado esse texto antes. É um texto que eu deixei amadurecer por opção, mas que eu sinto que passou do ponto. Ainda assim, tem certa validade. Espero que gostem. Acho que não voltei, acho que não volto. Eu estou indo por novos caminhos.

domingo, 3 de abril de 2011

Diante de mim não estou

            Descobri que, para escrever, devo me permitir sofrer. Parece óbvio há algumas vidas, não sei ao certo, só sei que faço – e funciona como quando eu te encontrei e você me encontrou e nós nos encontramos falando coisas bonitas e sem nenhum sentido, mas que funcionavam perfeitamente para nós – não sei quem éramos nós, acho que tínhamos todas as ambições do mundo, nenhuma e, ao mesmo tempo, a maior.
            Só que chega uma hora em que não precisarei mais me permitir sofrer. O meu sofrimento é que me permitirá alguns momentos de amnésia, alguma calmaria, tudo de forma bem tirânica – me permitirá um descanso do lápis e do papel.
            Minha paz tem prazo de validade. Acho que quem vive de paz infinita é santo e eu bem sei que pequei inúmeras vezes com a intenção vil de pecar. Mas santos escrevem, e escrevem coisas bonitas. Eles devem se inspirar no sofrimento dos outros, já que eles próprios não sofrem. Então a dor dos outros é bonita? Acho que sim. Quando me olho diante de meu reflexo e escrevo, só vejo monstros e demonstrações. Deve ser porque o que há dentro de mim de bonito nada tem. E eu sou outro de dentro do espelho. A agonia do meu outro eu me satisfaz e assim me condena.
            Gosto de me escrever para apagar depois. Não gosto do que fica. Prefiro não me explicar, então já nem sei bem o que é isso que faço. Tenho seqüestrado e assassinado cada expressão minha que aprisiono. Talvez me cito de forma egocêntrica, penduro meus quadros vitorianos pela casa, me visto das mais belas indumentárias e poso, diante do espelho, me clono e me escrevo. Nada eternizo.
            Quero um saco plástico e uma corda. Quero que alguém ponha minha cabeça dentro do saco plástico e amarre o meu pescoço com a corda, de forma a vedar a mim, ao plástico, ao saco e à corda. Quero respirar o que vem de dentro. É isso: só quero o íntimo, o visceral. Quero me sufocar de alma e fugir dos reflexos que eu persigo.


- Nunca demorei tanto pra postar. E, quando posto, não sou mais eu. Eu vi isso. Será que mais alguém verá? Obrigado aos que mantiveram sua paciência comigo e leram esse texto. Ele, de alguma forma, me marcou. Espero estar de volta.